quinta-feira, 13 de março de 2008

Uma estranha no ninho

Por Adriana Franco

Diferente entre os demais. Foi como me senti quando adentrei a sala de reunião. Os olhos se voltaram para a mais nova estranha do ninho. Estranha em TODOS os sentidos: porque nunca esteve antes, pela roupa que usava, pelos sapatos que calçava, pela forma que caminhava e pela maneira que se portou naquela abafada sala no centro da cidade. Sentar e abrir um caderno não deve ser uma atitude comum naquele recinto e, por isso, foi tomada com tanta estranheza.
Embora estivesse aflita em busca de algum conhecido, resolvi me aquietar e esperar enquanto recebia rajadas retas e diretas de uma curiosidade desafiadora por meio de olhares e cochichos da mesa posta na frente da sala, e onde deviam estar sentada cerca de seis mulheres.
Foi então que percebi que a espera se entenderia e tomei uma atitude ainda mais incomum naquele recinto carregado de reivindicações e esperanças: abri um livro e me pus a ler.
E essa atitude não despertou menos interesse que as tomadas anteriormente, apenas reforçou que eu não era como nenhum dos presente e, claramente, os meus motivos também eram outros.
Quando o assunto tornou-se polêmico a ponto de ser falado em alto e bom som resolvi prestar atenção. “A primeira corrupção é a dos miseráveis.” exaltava-se uma das mulheres que não tirava os olhos de mim. Não sei se por medo, precaução ou curiosidade. Elas até podiam conversar entre si, mas os olhares permaneciam voltados para mim.
O assunto me tomou por um assalto. Enquanto ela exclamava que não adiantava chamar apenas os políticos de corruptos, já que os eleitores se vendiam por cestas básicas. Minha vontade era de aplaudir, mas a aula de cidadania estava apenas começando.
Na sala poucos tinham levantado a mão quando questionaram quem teria o segundo grau completo e a pauta de reunião continha dois projetos de construção de moradia popular, a manifestação do dia das mulheres e a avaliação da assembléia anterior. Além do sorteio de uma boneca, que promoveria a arrecadação de fundos para a compra de água para a manifestação.
Pra mim, a reunião foi inválida do ponto de vista profissional e do que eu esperava conseguir, mas foi bastante positiva como cidadã. Gostei não só da frase que me assaltou como do conselho dado a todos e que tomei pra mim: “Peguem nota fiscal. Enquanto os brasileiros não se educarem e não fizerem valer seus direitos, dificilmente o País vai para frente.”
A princípio lamentei estar naquela sala enquanto os amigos estavam reunidos em um bar, mas quando saí de lá sequer consegui ir ao encontro deles. Eu ainda tinha muito que pensar depois dessa aula de vida.

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